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A facilidade de acesso a determinados conteúdos e serviços transformou a forma como consumimos: não precisamos mais esperar por nada e mesmo assim nunca tivemos tanta pressa.
O que aprendemos nesses últimos dias:
💰 O acesso fácil e rápido a produtos mudou a forma como consumimos;
⏳ Estamos cada vez mais impacientes e imediatistas;
🆘 Isso tem impacto: menos tolerância e mais impulsividade;
🛍️ Assim, acabamos gastando mais do que gostaríamos em coisas que nem sempre usamos.
Estamos num futuro inimaginável
Você tinha 10 anos e estava de férias. Acordou às 9h, pegou um achocolatado e sentou confortavelmente no sofá, se preparando para assistir ao seu desenho preferido. Lá fora está chovendo, então você vai passar o dia assistindo TV, esperando por seus programas preferidos: Digimon, As Três Espiãs Demais e Todo Mundo Odeia Chris. Você só tinha 3 canais disponíveis na TV aberta e esperava com entusiasmo o horário de cada uma dessas atrações começar.
Se você não é millenial, talvez não tenha se identificado com esta cena. Mas você imagina essa situação hoje em dia? Esperar pacientemente para assistir um episódio daquela série que você gosta e ainda não conseguir escolher exatamente o que quer assistir? Era uma época que a internet como conhecemos hoje não existia, e o streaming nem passava pela nossa cabeça.
Num mundo pré-Netflix, era difícil pensar que hoje estaríamos pagando em média R$ 118 todos os meses para ter cerca de 4 assinaturas. Seja de filmes e séries, música ou jogos, hoje pagamos para consumir uma grande diversidade de plataformas de entretenimento, produtos e experiências. Isso deixa a nossa rotina mais fluida e ágil, mas por que isso não faz com que a gente se sinta tão melhor assim?
Por um lado, a conveniência
Pode ser para assistir aquele filme na hora que bate a vontade ou para receber em casa o produto que você acabou de comprar. Se você pode pagar por isso, é quase instantâneo. Os preços dessas comodidades nem sempre são tão altos, e é justamente aí que mora o perigo: vamos somando pequenas taxas de conveniência que, no final do mês, podem representar uma parte significativa da nossa renda.
Hoje, 65% dos consumidores aceitariam pagar mais por uma entrega mais rápida ou no mesmo dia, e quase metade dizem que esse tipo de serviço os deixa mais propensos a comprar. O mercado entendeu o recado e tem investido pesado em soluções que encurtam o tempo entre o clique e a entrega: 60% dos pacotes enviados no segundo trimestre de 2025 chegaram em até 3 dias. Em 2024, a Amazon bateu recorde com mais de 5 bilhões de itens entregues no mesmo dia ou no dia seguinte à compra.
Vamos admitir: isso é legal. Nossa rotina está muito corrida, as mudanças ocorrem tão depressa. Sentimos a necessidade de ter tudo pra ontem. Mas será que essa facilidade não é um dos fatores que nos deixou com esse sentimento de urgência? É aquela história, não sabemos quem veio primeiro, o ovo ou a galinha. Mas refletir sobre isso é importante para que a gente consuma de forma mais consciente e consiga respirar em meio às esperas.
Por outro lado, a urgência e o excesso
Temos acesso a muita coisa, muito rápido. E quando esse acesso não vem na mesma velocidade, a impaciência aparece e, às vezes, até a desistência. Hoje, 40% dos usuários abandonam um site que leva mais de três segundos para carregar. Também temos pouca paciência quando há bugs ao acessar diferentes apps.
Esse comportamento se relaciona com o conceito de desejo por fechamento (desire for closure), que explica como nossa necessidade de resolver e concluir coisas aumenta a nossa impaciência, especialmente à medida que sentimos que o fim está próximo. Essa pressa por finalização e gratificação constante traz uma série de efeitos colaterais: menor tolerância à frustração, aumento da impulsividade e redução da resiliência emocional.
A busca por gratificação imediata pode ainda levar a escolhas impulsivas, como compras não planejadas que comprometem o orçamento. Esse comportamento é explicado pelo conceito de desconto temporal, o que nos faz preferir recompensas menores agora a benefícios maiores no futuro. No Brasil, 41% dos consumidores que compram por impulso estão inadimplentes. Muitas dessas decisões são tomadas em momentos de ansiedade, estresse ou tédio e o alívio momentâneo costuma ser seguido por arrependimento e angústia.
Considerando tudo isso vale pensar: será que precisamos mesmo de tanto acesso e rapidez assim? Ter acessos ilimitados e escolhas infinitas nem sempre nos deixa mais tranquilos. Quem nunca passou tanto tempo tentando escolher o que assistir que acabou sem energia para realmente curtir o que escolheu?
Cena da série Girls (HBO): “Às vezes eu só queria que alguém me dissesse algo como: “é assim que você deveria passar os seus dias” e “é assim que o resto da sua vida deveria ser”.
✨ INSIGHT’S TEAM 🧠
Então, voltando para aquele sofá da infância, naquela espera por seu programa preferido... Você não tinha um feed para ficar rolando enquanto esperava, nem podia pedir um lanchinho com poucos cliques no celular. Mas talvez a espera era menos incômoda, mesmo sendo mais longa e sem as distrações que temos hoje.
A ideia não é ser saudosista e dizer que “antigamente tudo era melhor”. Vale refletir sobre o quanto realmente precisamos de toda essa agilidade e imediatismo e se realmente não estamos pagando por coisas que nem usamos. Talvez a gente precise pensar sobre como a facilidade de acesso e a rapidez na hora de comprar e receber algo nos torna um pouco mais impacientes e até mais consumistas.